domingo, 1 de janeiro de 2012

Eu passei longos trinta minutos olhando para sua face enquanto ela, com a boca entreaberta e os olhos pequenos, mas cheios de amor, contemplavam a habilidade do menino ao folhear as páginas de um álbum antigo de fotografia, enquanto a criança tentava adivinhar quem seriam aquelas figuras tão distantes e irreais, das fotos pregadas no álbum.
Fechei, quase mecanicamente o Nabokov que lia, e tentei decifrar seu olhar maternal. Senti o reflexo do amor que seus olhos lançavam insaciavelmente à criança e tentei imaginá-los refletindo-o a mim.
Porque era eu a criança das fotografias estampadas no velho álbum, que hoje crescida, tentava incansavelmente relembrar qualquer mínimo momento da minha vida, no qual ela tivesse lançado a mim aquele mesmo olhar que agora lançava à criança.
Sim, eu era a criança da fotografia, mas era além de tudo, real e vasculhava agora detalhadamente meu passado na busca por qualquer sorriso, palavra de amor, ou abraço e outros carinhos que ela pudesse ter me lançado no passado, talvez quando eu tivesse a idade da criança (quem sabe?) como a via refletindo nos seus olhos, para a criança.
Não achei nenhuma memória a que creditasse esses carinhos, achei antes, memórias que por longos dezoito anos tentei afastar. Eu só havia visto o rancor nas chibatadas que levava, quase semanalmente e agora, eu descobrira em seus olhos o amor, ainda que não lançado para mim. Agora eu sabia. Eu via. Eu sorria. Eu chorava. Ela possuía amor. Ela estava, naquele instante, cheia de amor. E eu a olhava...

Nenhum comentário:

Postar um comentário